quarta-feira, agosto 25, 2010

Entendimento da Vida

A quantas anda o nosso entendimento da vida? Em tempos passados, as pessoas tinham pouso no circuito migratório da existência... Entre uma estação e outra, paravam para pensar... Refletir sobre o rumo tomado, redirecionar a trajetória, estas eram possibilidades que mereciam e recebiam atenção maior. Era costume filosofar! Ler e discutir a construção racional e estética de grandes pensadores, e até mesmo escrever, escrever muito. Havia muita gente que se dedicava à produção de textos, literários ou filosóficos... Havia poetas em profusão!



E agora, o que há? Talvez, no contexto da vida em sociedade, o tempo para filosofar, para compartilhar a própria criação literária já não seja o mesmo... Mas, no mundo virtual, cujo universo se desdobra em perspectivas sem limite, a Web atesta: nunca houve tamanha possibilidade de contato entre as mentes humanas.


Ainda assim, o necessário tempo para refletir, para observar o fluxo da vida e para produzir algo que transcenda nossa existência, no mar de informações que trafega pela Internet, continua escasso. Tempo para estudar ou para produzir conhecimento, - temos de sobra? Podemos, conseguimos escolher? Seria esta, a nosso ver, uma questão simples,- sim -, de escolha, apenas. A compreensão da vida pede discernimento; esse é um entendimento que vale a própria vida inteira. Tomá-la nas mãos e dar-lhe um sentido é uma conquista que supera todas as conquistas disponíveis a nos tentarem com suas sutis e sedutoras formas, todas impermanentes.


Exatamente marcadas pela impermanência na qual reside a raiz do sofrimento. Queremos que nossas ilusões se concretizem e se perpetuem... Não possuímos um corpo eterno, mas queremos ter a ilusão de possuir a matéria que compramos ou ganhamos através dele. Por outro lado, a escuta do que nos diz a vida não é uma prática adotada por nós. Se ela nos contraria, não tentamos compreender porque motivo ela não nos proporciona o que desejamos, ou nos retira o que julgamos ser propriedade nossa. E continuamos insistindo no que deveria ser descartado. Essa é uma questão muito interessante. A origem do estresse, nos parece ser esta: não percebemos quando mudar de opinião, de atitude, de rumo. Essa surdez mental nos leva ao estado de sofrimento. Em suma, de incompreensão, de incapacidade de responder, quando questionados: esse não é o caminho, poderia tomar outra via, ou, esta não é a forma ideal, poderia proceder de outra maneira? – a vida nos pergunta e de nós depende a qualidade da resposta. Mais do que isso, se não respondemos adequadamente, ela também insiste, até redirecionarmos nossa posição!


As pessoas resistentes à mudança sofrem tanto quanto mais resistentes são elas. Adaptar-se e responder propositivamente aos desafios, esse é um atributo redutor do estresse e capaz de consolidar uma melhor qualidade de vida, mais saúde e prosperidade também.


A rapidez com que nos adaptamos, em nosso entender, está associada à nossa criatividade, pede humor e, sobretudo, preserva nossas reservas de energia mental e física. Sofrer ou resistir, desgasta muito mais do que se adaptar! A transformação de nossa pessoa, o desenvolvimento permanente, a atualização constante, nos proporciona equilíbrio, sabedoria e competência. Viver em paz é uma arte suprema, - a arte do equilíbrio. Esse é um aspecto muito interessante: a medida justa entre a resistência e a mudança, fundada em nossa capacidade de discernir, pode nos conferir um estado interior de paz, cuja força assemelha-se às longas raízes de uma frondosa árvore fincada no solo.


De que se nutre uma árvore? De onde retira ela, os subsídios para sustentar sua vida? Como se mantém em pé, nas intempéries? Ela cresce em direção à luz, e compartilha flores e frutos, como quê ciente de seu próprio papel...


Há uma percepção extraordinária da árvore em relação à luz, ela não possui o sentido da visão com nós, simplesmente sente e busca a luz... O broto da semente não se engana, não troca a treva da terra pela claridade no ar...


E nós? Onde fincamos as raízes do nosso espírito? De quê o alimentamos? E, sobretudo, se não pudéssemos perceber a luz, deixaria ela de existir? Obviamente, não. Nosso entendimento da vida, portanto, carece desta sutil suspeita: o que existe e não atinamos ainda? Como uma árvore sente a luz, como um ser dotado de visão enxerga o mundo, o homem pode reconhecer a origem e o destino da vida? De sua própria vida? Parar para pensar e imaginar que o universo é um infinito conjunto de possibilidades nos convida ao uso de nosso par de asas mentais! Afinal, se somos aves migrando pelo mundo, precisamos saber de onde partimos e para onde vamos, cientes de que não conseguiremos levar bagagem alguma além da que instalamos no coração e processamos no cérebro... Nossa maior riqueza é constituída pelo que proporcionamos aos outros; a liberdade absoluta de compartilhar se contrapõe à prisão da posse, - o que retemos nos possui. Consome nossa vida, nossa força de trabalho, nosso tempo de ser feliz, de conviver com alegria...


O tempo de ser feliz começa agora: depende de nossa vontade. Podemos escolher! Se não conseguirmos, poderemos afinar a nossa escuta da vida. Melhorar o nosso entendimento dela. E tentar de novo, até atingirmos o ponto de equilíbrio, a paz interior, condição íntima de felicidade que independe de condições externas.

Rita De Blasiis

sexta-feira, maio 21, 2010

Artes integradas na Vovó Tuta

Sobretudo, um encontro...
Nos reunimos num lugar aconchegante para compartilharmos música e pintura, sob a égide poética de Cecília Meireles traduzindo Li Po. A Lua de Li Po esteve presente e iluminou a casa...
A promessa de um novo momento ficou no ar.
Nos encontraremos em breve, quem não foi, terá outra oportunidade!

sábado, maio 08, 2010

Pintura Poesia Música




Abre-se uma fresta no tempo e no espaço: o século 8 da China nos visita através da Poesia, em especial coletânea do poeta Li Po. Momento propício para se vivenciar uma integração das Artes: a Pintura inspirada na técnica de origem chinesa Sumi-ê, e a leitura dos poemas traduzidos por Cecília Meireles, são realizadas ao vivo por Rita De Blasiis. A Música é clássica, em belo repertório de peças curtas para piano, a cargo da solista Cecília Maria.
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"As rosas precisam de sol. As mulheres precisam de amor.
Os caracteres que traço não precisam senão
do rumor dos bambus:
e são eterno! eternos!"
Li Po

quarta-feira, março 24, 2010

Um menino de Oco de Árvore

Certa vez, estava no Parque Municipal de Belo Horizonte, aguardando o início de um espetáculo: Na pontinha do Sonho, de Silvino Fernandes... Era o Grupo Patati Patatá e o Grupo Zero, um trabalho maravilhoso de Teatro de Bonecos...Enquanto aguardava, me divertia nos pedalinhos da lagoa...Avistei, então, à margem do pequeno lago, uma criança pescando...Aproximei-me. Começamos a conversar e ele, a me contar, em pedacinhos de fala, um pouco da sua vida. Foi um papo agradável, apesar de surreal. O que ele contava, era muito natural em seu contexto, para ele...
Quando nos despedimos, convidei-o para ir ao Teatro comigo, pois era algo que ele gostaria muito, segundo afirmou com interesse e entusiasmo. Nunca havia visto uma peça... Quando desci do pedalinho, algum tempo depois, ele, de repente, surgiu detrás de uma grande árvore com um embrulho de jornal nas mãos. Sorriu e disse: "Eu queria dar para a senhora"... Abriu o presente. Lá estava, um grande peixe prateado, refletindo a luz dourada do pôr-do-sol. Agradeci muito por sua gentileza, e expliquei que não sabia preparar um peixe de forma adequada, que ele iria fazer melhor proveito de sua pescaria no parque... O menino se despediu, rindo de mim e se foi, sumindo na escuridão do Parque Municipal...Voltei, depois, ao local, conforme o combinado, para levá-lo ao Teatro e começarmos um contato para um encaminhamento. Mas, ele sabia perfeitamente, embora pequeno, devia ter lá seus nove ou dez anos, que corria o risco de perder a sua liberdade...Perguntei se levaria o peixe para sua mãe, e uma sombra atravessou o seu olhar, era , sim, mais provavelmente, um pequenino morador de rua.
Esse episódios na vida gente são frestas através das quais contemplamos a estranha diversidade da experiência humana, aprendizagens cujo curso não conseguimos interromper, mas, nos despertam profunda e intensa compaixão.
Algum tempo depois, escrevi uma peça teatral, inspirada neste menino...
Um Menino de Oco de Árvore, que precisava reencontrar sua esperança para entrar na festa da vida...
Trabalhei com questões relativas aos direitos das crianças de se desenvolverem, de participarem plenamente do contexto cultural humano, vivendo uma vida digna. Através do imaginário que a Literatura possibilita, busquei criar uma história simbólica, mas, capaz de provocar a reflexão do espectador. A gente, afinal, escreve pra isso mesmo...Nos encontramos com as crianças agora, enquanto é tempo de ajudá-las a compreender o quanto é importante interferir no futuro de modo que as próximas gerações não tenham que sofrer o que nós sofremos pelo descaso dos que nos precederam...O futuro é tão somente um reflexo do presente, nós já sabemos, e elas, as crianças, precisam ir entendendo isso o mais rapidamente possível...
Virgínia, a amiga do protagonista, canta para ele, num dado momento da peça: "O país dos sonhos é de todo mundo, /todo mundo pode sonhar...Eu descobri, que lá no fundo, / quem não gosta de imaginar? Uma coisa bonita, um lugar distante, / que fica lá onde tudo pode vir-a-ser... / Um brinquedo, ou uma estrada brilhante, / que vai pra lá onde a gente quer viver... / O Tutuca quer entrar na festa,  / na festa ele vai entrar. /  União, nossa força é esta: / o seu sonho vamos realizar"!
Isso equivale dizer, que futuro vamos querer agora? Juntos, podemos querer...e começar!

Veja mais livros nossos em rhttp://www.editorarhj.com.br/
Sobre o espetáculo veja o que diz Rodrigo Robleño. Disponível em: http://teatrocircoteatro.blogspot.com/

domingo, março 07, 2010

Murta, flor de noiva

Hoje, à tarde, quando retornei para casa, caminhando pela minha rua, reparei que as Murtas estavam floridas...Pensei: será que a Murta que plantei deu seu primeiro ramo de flor? Tratei de verificar e encontrei! O buquê, perfeito, com aquele aroma delicioso...que florzinha mais delicada e bela!
Plantei a árvore no gramado da calçada larga, em frente a janela da sala...quando se tornar adulta e florescer, o seu perfume vai entrar pela casa, trazendo sua paz...Não sei porque motivo, mas, para mim, este é o cheiro da felicidade!Alguma coisa em minha memória associa o aroma da Murta a um sentimento de alegria, de tranquilidade, de indizível bem-estar espiritual...Já pintei sumi-ê com tinta guache Talens e água com flores de Murta...é muuuito bom! Estava pesquisando na Internet e descobri que essa água de Murta tem nome: água de anjo!
Nem mais uma palavra caberia aqui, só flor, ao vivo e a cores, com perfume e tudo. Inté!

domingo, fevereiro 07, 2010

Sem palavras...


Andei a pensar como explicaria de forma suscinta a razão pela qual escolhi esse título para o blog. Por que explicar? - seria um início bastante concreto para conduzir minha reflexão "pré-texto"... Hoje é sempre o único dia que temos. O passado não existe e o futuro ainda não aconteceu. Assim posto fica sumariamente explicado: todo dia é dia de árvore!
A angústia dos tempos modernos, ou como bem disse Baudelaire, da modernidade, é a necessidade de explicar e a impossibilidade de ser ouvido porque já não há mais tempo de nos explicarmos tanto. Para que não me pese essa terrível angústia contemporânea, justifico então: as árvores estão presentes na história da minha vida intensamente. Tanto que joguei a palavra árvore na pesquisa de arquivos do meu micro e encontrei um livro, uma infinidade de produções...E de imagens também...Uma delas, coloco aqui. Tem um poder de síntese incrível! Conseguiria substituir este texto com absoluta perfeição.Que feliz e raro momento esse: descobrir que podemos guardar o sentimento de amor de uma grande árvore e estendê-lo a todas as árvores do mundo é um presente divino. Ao pai fotógrafo, um muito obrigada, que esteja ele em paz onde estiver. E vamos, pois, às àrvores!
Rita De Blasiis

Texto escrito em Barão Geraldo, na sede do Lume(1) e publicado na Coluna Cor respondência do Jornal Correio de Araxá em fevereiro de 2004.

Caro Leitor,

Melhor dizendo, olá! Estou a ponto de morrer de saudade Araxá! Sempre que me ausento de Minas sou acometida por uma terrível nostalgia de montanhas. Definitivamente não sei sobreviver sem o amanhecer que acontece na esquina esquerda de minha rua, muito menos sem o por-do-sol que se desenrola exatamente na esquina direita. Pouca gente mora em uma rua que começa no meio do nada urbano e termina na curva de uma estrada que atravessa o mesmo mato. Penso que o mais trágico dos poemas que Drummond escreveu, aquele que me aterroriza fundamentalmente é "E agora, José, quer ir pra Minas? Minas não há mais"... E se assim não houvesse Minas mais? Quando retornei para Araxá, retornei para minha casa, que já não existia, mas, entendi depois, que meu teto é feito de estrelas e as minhas paredes, de colinas.
Você já foi à Serra da Canastra? Não?! Então, vá!- diria Caymmi, prontamente. E a propósito, me lembrei de que meu terror fundamental perante o poema de Drummond se prende ao fato de que o suprimento de poesia que se oculta sob o solo mineiro, é indispensável em minha vida.
Onde está o seu suprimento de poesia, leitor amigo? Olá! Pergunto eu aqui de Barão Geraldo...onde, ooonde, ooondeee? O eco é um sopro inverso do espírito, pensamos ouvir o outro quando conversamos com, ponto com, www, noves fora, Minas! Te peguei, hein? Hoje, estou em paralelas tangenciais, chuvas torrenciais, chove riso em minha cabeça, apesar da ausência dos costumeiros horizontes. E você o que chove na sua cabeça?
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...entresussurrante aconselhamento: o que chove na sua cabeça, depende de onde você coloca ela. Tenho uma amiga que chegou em uma cidade mineira, num dia qualquer, de um ano qualquer. Tomou um banho e saiu para caminhar, caminhou bastante e se assentou em um banco de praça, se assentou e olhou para cima, olhou para cima e viu um ipê branco, todinho coberto de flor. Então, como se fosse ao toque do seu olhar, as flores do ipê caíram todas de uma só vez, sobre a sua presença..............................................................................................................................................
Minha amiga queria plantar um ipê branco no quintal de sua casa para viver esse um só instante novamente. Mas, essa é a grande e maravilhosa dor verdadeiramente incompreensível da vida: a felicidade nos visita, no mais das vezes, é preciso encontrá-la recolhida em um canto qualquer de nossa própria casa.
Assim é que estou aqui, em Barão Geraldo, pintando aquarelas, onde faço o sol amanhecer e entardecer, o papel em branco pede cor e eu confesso a ele tudo o que sinto. É preciso reter a paz e a alegria no traço por onde passam a vida, o grito da crianças, o gato, o vulto, o outro lado. Gosto, principalmente, do outro lado onde as sombras do devir se preparam para entrar em cena. E eu vou chegando, que é um jeito avesso de mineiramente dizer: estou indo. Inté mais!

Rita De Blasiis

(1)Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas Teatrais da Unicamp - Distrito de Barão Geraldo