Quando nos despedimos, convidei-o para ir ao Teatro comigo, pois era algo que ele gostaria muito, segundo afirmou com interesse e entusiasmo. Nunca havia visto uma peça... Quando desci do pedalinho, algum tempo depois, ele, de repente, surgiu detrás de uma grande árvore com um embrulho de jornal nas mãos. Sorriu e disse: "Eu queria dar para a senhora"... Abriu o presente. Lá estava, um grande peixe prateado, refletindo a luz dourada do pôr-do-sol. Agradeci muito por sua gentileza, e expliquei que não sabia preparar um peixe de forma adequada, que ele iria fazer melhor proveito de sua pescaria no parque... O menino se despediu, rindo de mim e se foi, sumindo na escuridão do Parque Municipal...Voltei, depois, ao local, conforme o combinado, para levá-lo ao Teatro e começarmos um contato para um encaminhamento. Mas, ele sabia perfeitamente, embora pequeno, devia ter lá seus nove ou dez anos, que corria o risco de perder a sua liberdade...Perguntei se levaria o peixe para sua mãe, e uma sombra atravessou o seu olhar, era , sim, mais provavelmente, um pequenino morador de rua.
Esse episódios na vida gente são frestas através das quais contemplamos a estranha diversidade da experiência humana, aprendizagens cujo curso não conseguimos interromper, mas, nos despertam profunda e intensa compaixão.
Algum tempo depois, escrevi uma peça teatral, inspirada neste menino...
Trabalhei com questões relativas aos direitos das crianças de se desenvolverem, de participarem plenamente do contexto cultural humano, vivendo uma vida digna. Através do imaginário que a Literatura possibilita, busquei criar uma história simbólica, mas, capaz de provocar a reflexão do espectador. A gente, afinal, escreve pra isso mesmo...Nos encontramos com as crianças agora, enquanto é tempo de ajudá-las a compreender o quanto é importante interferir no futuro de modo que as próximas gerações não tenham que sofrer o que nós sofremos pelo descaso dos que nos precederam...O futuro é tão somente um reflexo do presente, nós já sabemos, e elas, as crianças, precisam ir entendendo isso o mais rapidamente possível...
Virgínia, a amiga do protagonista, canta para ele, num dado momento da peça: "O país dos sonhos é de todo mundo, /todo mundo pode sonhar...Eu descobri, que lá no fundo, / quem não gosta de imaginar? Uma coisa bonita, um lugar distante, / que fica lá onde tudo pode vir-a-ser... / Um brinquedo, ou uma estrada brilhante, / que vai pra lá onde a gente quer viver... / O Tutuca quer entrar na festa, / na festa ele vai entrar. / União, nossa força é esta: / o seu sonho vamos realizar"! Isso equivale dizer, que futuro vamos querer agora? Juntos, podemos querer...e começar!
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Sobre o espetáculo veja o que diz Rodrigo Robleño. Disponível em: http://teatrocircoteatro.blogspot.com/